O guia psiquiátrico para ajudar quem possui Transtorno Bipolar

O Transtorno Bipolar pode ser um grande desafio para famílias, amigos e, principalmente, para a própria pessoa. Aqui no Instituto Alceu Giraldi gostamos de dizer que a informação é o primeiro passo para o diagnóstico e tratamento adequado. Por isso, vou compartilhar alguns fatores importantes para todos envolvidos recuperarem seu bem-estar e qualidade de vida. Pois acredito que o Transtorno Bipolar não precisa ser uma grande limitação. Há estratégias e caminhos eficazes para uma vida plena e equilibrada.

Separei três grandes tópicos que são identificação e diagnóstico, tratamento e a importância do apoio familiar. Vamos falar um pouco sobre eles?

Compreendendo o Transtorno Bipolar

O primeiro passo é compreendermos o transtorno bipolar que é uma condição psiquiátrica caracterizada por mudanças extremas de humor, variando entre episódios de mania (ou hipomania) e depressão. Essas oscilações podem impactar significativamente a qualidade de vida de uma pessoa, afetando suas emoções, níveis de energia e capacidade de funcionamento diário. Além disso, pode impactar em decisões que podem ser coisas levianas do dia-a-dia, até mesmo colocar sua vida em risco.

Sintomas e Identificação

Episódios de Mania

Durante um episódio maníaco, a pessoa pode experimentar um aumento significativo de energia e atividade, frequentemente acompanhado por uma sensação avassaladora de euforia. Assim, os pensamentos tornam-se rápidos, quase como se estivessem em uma montanha-russa mental, e o comportamento pode tornar-se impulsivo. Por isso, digo que essa fase pode incluir:

  • Sensação de euforia ou irritabilidade: A pessoa pode sentir-se extremamente feliz ou, em contraste, facilmente irritada por menores contratempos. É comum dizer que a pessoa está com as emoções à flor da pele.
  • Diminuição da necessidade de sono: Muitas vezes, a pessoa sente-se descansada com apenas poucas horas de sono.
  • Autoconfiança exagerada: A sensação de invencibilidade pode levar a decisões imprudentes, como gastos excessivos, comportamentos de risco ou investimentos financeiros arriscados.
  • Fala acelerada: Pode haver uma pressão para continuar falando, com dificuldade em permanecer focado em um único tópico.
  • Envolvimento em atividades de alto risco: Isso pode incluir direção imprudente, abuso de substâncias ou comportamentos sexuais de risco.

Agora, depois de um episódio de mania, a pessoa com Transtorno Bipolar tende a mudar de direção e ir para o episódio depressivo. Ou seja, muda do polo de atividade e euforia para isolamento e depressão.

Episódios Depressivos

A fase depressiva do transtorno bipolar é caracterizada por uma queda extrema no humor e na energia. Durante esse período, a pessoa pode sentir-se consumida por desesperança, o que impacta negativamente suas atividades diárias. Aqui os sintomas incluem:

  • Tristeza persistente: Sentimentos contínuos de tristeza, vazio e desesperança que são difíceis de afastar. São sintomas bem similares ao da depressão.
  • Fadiga ou perda de energia: Uma sensação esmagadora de cansaço que torna difícil realizar as tarefas mais simples.
  • Perda de interesse ou prazer: Atividades que antes eram agradáveis podem parecer sem sentido ou desinteressantes.
  • Dificuldades de concentração: Problemas em tomar decisões, pensar com clareza ou lembrar-se de detalhes.
  • Alterações no apetite ou peso: Isso pode incluir comer em excesso ou muito pouco, levando a mudanças significativas no peso.

Note que essas fases pode durar dias ou até semanas. Por isso, quem está perto consegue perceber melhor essas mudanças do que a própria pessoa. Para quem possui o Transtorno Bipolar e ainda não foi diagnosticado, para ela a vida está normal.

Um exemplo de Transtorno Bipolar

Marta, nome fictício para não expor a paciente, é uma designer gráfica de 32 anos, que foi diagnosticada com Transtorno Bipolar Tipo I (que você pode saber mais no post do Dr. Thiago, clicando aqui).

Durante um período maníaco, Marta começa a sentir-se excepcionalmente criativa e produtiva. Ela decide iniciar múltiplos projetos ao mesmo tempo, convencida de que pode gerenciar tudo sem dificuldade. Sua energia parece inesgotável, a ponto dela dormir apenas duas horas por noite sem sentir cansaço. Além disso, ela se sente invencível, faz uma compra impulsiva de um carro caro, confiando que logo receberá uma promoção no trabalho. Olha o prejuízo.

Após algumas semanas, ela entra no que chamamos de estado depressivo. Assim, ela começa a sentir-se extremamente triste e desmotivada, lutando para sair da cama todas as manhãs. As tarefas no trabalho que antes a entusiasmavam agora parecem opressivas e insuportáveis. Ela perde o interesse em atividades sociais e hobbies, isolando-se de amigos e familiares. Sua concentração é prejudicada, e ela encontra-se incapaz de completar tarefas simples, o que preocupa seus colegas de trabalho.

Esse era o looping desta paciente que transitava entre os períodos de invencibilidade com os períodos de depressão e desânimo. Para a Marta ela sempre esteve normal, ela só sentia mais para lá e outras vezes mais para cá, como ela mesmo disse. Porém, quem estava perto que conseguiu identificar e trazer para o consultório.

Quer saber como a Marta está hoje? Ela é uma designer gráfica profissionalmente estável (e realizada), teve alguns momentos de mania por aqui e ali, mas ela aprendeu a identificar e a medicação está ajudando bastante. Hoje ela é uma pessoa e profissional funcional e feliz.

Agora vamos falar de diagnóstico e tratamento?

Diagnóstico e tratamento do Transtorno Bipolar

O diagnóstico preciso

O diagnóstico do transtorno bipolar é um processo detalhado e multidimensional. Além disso, o diagnóstico correto é essencial para garantir um tratamento eficaz. Para isso, o processo geralmente envolve algumas etapas:

  • Avaliações clínicas: Aqui faremos uma entrevista profunda e abrangente. Por isso, que aqui no Instituto Alceu Giraldi, nossas consultas beiram a 1h. Não dá para diagnosticar da maneira correta em 10 minutos. Aqui vamos compreender a natureza dos sintomas e sua duração. Além disso, vamos conversar e convido também a família para participar desta conversa. Quanto mais informação melhor! Só assim teremos uma visão completa dos episódios maníacos e depressivos.
  • Histórico médico: Vamos examinar o seu histórico médico ajudando a identificar padrões de humor e comportamentos ao longo do tempo. Assim, conseguimos identificar e revelar se há fatores genéticos ou condições pré-existentes que contribuem para os sintomas.
  • Testes laboratoriais: Embora o transtorno bipolar não seja diagnosticado por meio de exames de sangue ou imagens cerebrais, esses testes podem ser usados para descartar outras condições médicas que possam mimetizar ou exacerbar os sintomas, como distúrbios da tireoide ou desequilíbrios hormonais. É bem importante essa análise para escolha das estratégias corretas.

Agora falando do tratamento eficaz

Após a identificação do diagnóstico de Transtorno Bipolar, vamos seguir juntos para uma compreensão da vida e rotina do paciente. Logo em seguida, analisaremos uma abordagem para o tratamento do transtorno bipolar do paciente. Gosto de dizer, principalmente no início do tratamento, que é combinando medicação, psicoterapia e mudanças no estilo de vida, que conseguiremos obter excelentes resultados, vejamos:

Terapia medicamentosa

  • Estabilizadores de humor: Medicamentos como o lítio são os que nós psiquiatras frequentemente prescrevemos para ajudar a equilibrar o humor, prevenindo tanto episódios maníacos quanto depressivos. Pois, o lítio tem um histórico longo e comprovado de eficácia, mas requer monitoramento contínuo dos níveis sanguíneos para evitar toxicidade. Mas gosto de lembrar que cada caso é um caso e deve ser analisado cuidadosamente.
  • Antipsicóticos e anticonvulsivantes: Medicamentos antipsicóticos atípicos e anticonvulsivantes também podem ser usados para estabilizar o humor e controlar sintomas tanto maníacos quanto depressivos.

Aqui quero ressaltar que o tratamento pede estes medicamentos estabilizantes de humor e a estratégia correta é uma boa análise e acompanhamento. Gosto de dizer que as consultas regulares sãos os fatores de sucesso do tratamento. Por isso, tenha sempre contigo um psiquiatra de confiança.

Psicoterapia

A psicoterapia é essencial para acompanhar a evolução e dar suporte às eventuais mudanças que ocorram na vida do paciente. Os psicólogos acompanham de perto o dia-a-dia e as eventuais mudanças no comportamento e na forma de lidar com as crises, como chamamos aqui.

Além disso, a psicoterapia também é importante para os familiares. Para encontrarem um local de acolhimento e compreensão. Dessa forma, diversas estratégias seguem para que o paciente e a família tenham melhora na qualidade de vida.

Estilo de vida saudável

O transtorno bipolar pode trazer alguns gatilhos e a melhor forma de ajudar é tendo uma completa análise do estilo de vida e trazer o máximo de saúde para os equilíbrios da mente e do corpo.

  • Alimentação equilibrada: Uma dieta rica em nutrientes pode ter um impacto positivo no humor e na energia. Recomendo evitar alimentos processados e estimular o consumo de frutas, vegetais e grãos integrais.
  • Exercício físico regular: Atividades físicas, como caminhada, ioga, ou ciclismo, são benéficas para a saúde mental, ajudando a reduzir o estresse e melhorar o humor geral.
  • Padrão de sono adequado: Manter uma rotina de sono consistente é crucial para estabilizar o humor. Recomendo evitar cafeína e eletrônicos antes de dormir para promover um sono reparador.

Aliás, você pode ver este post que fala sobre insônia e este outro sobre higiene do sono. Conhecimento positivo para quem tem ou não transtorno bipolar.

O tratamento bem-sucedido de Transtorno Bipolar

Os tratamentos bem-sucedidos do transtorno bipolar são aqueles que são individualizados e abordam a condição de maneira holística. Digo que o equilíbrio entre medicação, psicoterapia e hábitos saudáveis é a chave para controlar os sintomas e melhorar a qualidade de vida.

A rede de apoio: a base do tratamento do Transtorno Bipolar

O apoio dos familiares e amigos é fundamental para o sucesso no tratamento e gestão do Transtorno Bipolar. Pois esses exercem uma influência poderosa na vida de quem vive com essa condição, ajudando a criar um ambiente estável e compreensivo. Além disso, a colaboração e participação é essencial para o bem-estar mental e emocional do paciente.

Os familiares que são os primeiros a perceber a mudanças de comportamento ou humor, são aliados essenciais desde a identificação dos sintomas até o tratamento. Uma rede de apoio robusta pode ajudar a prevenir crises, fornecer suporte emocional e assegurar que o paciente siga os tratamentos e recomendações médicas.

Além disso, a educação adequada, como você está fazendo agora lendo este artigo, ajuda a reduzir os estigmas e preconceitos. Dessa forma, promovendo um ambiente acolhedor. Outro ponto importante é que ao compreender as nuances do Transtorno Bipolar, familiares e amigos conseguem desenvolver mais empatia e até fortalecendo as relações pessoais.

O objetivo é a rede de apoio é promover um espaço seguro para o paciente expressar suas preocupações e sentimentos.

Como podemos ajudar, como rede de apoio?

Educação correta

Aqui no Instituto Alceu Giraldi, gostamos de dizer que o primeiro passo para um apoio eficaz é informar-se. Dessa forma, conhecer os sintomas, as fases e os tratamentos disponíveis ajuda os familiares a reconhecer os sinais de alerta e a interagir de forma mais sensível e apropriada.

Inclusive deixo mais um artigo do Dr. Thiago sobre bipolaridade aqui, com mais informações.

Comunicação aberta

Manter uma linha de comunicação aberta e constante é vital. Isso envolve escutar ativamente e proporcionar um espaço onde o paciente se sinta confortável para compartilhar sem medo de críticas.

  • Discussões regulares sobre sentimentos: Gosto de incentivar o diálogo frequente sobre como o paciente está se sentindo pode ajudar a identificar problemas antes que se transformem em crises.
  • Criação de um diário familiar: Documentar episódios, mudanças de humor e eventos estressantes pode ser útil tanto para o tratamento contínuo quanto para reuniões com profissionais de saúde.

Planejamento de crise

Ter um plano de crise bem definido pode prevenir ou minimizar o impacto de episódios maníacos ou depressivos é importante. Uma das melhores estratégias é termos conhecimento prévio do que fazer quando houver uma crise. Gosto de dizer que este planejamento pode salvar vidas e minimiza os prejuízos.

  • Elaboração de um plano de emergência: Inclua contatos de emergência, como médicos, terapeutas e amigos próximos que possam intervir em crises. Na família é importante definir o papel de cada membro para situações de emergência.
  • Ensaios de situações de crise: Realizar simulações de como lidar com uma crise pode proporcionar confiança e assegurar que todos saibam o que fazer em uma situação real. Inclusive o paciente deve estar ciente e sugiro algumas vezes até a participação de um psicólogo junto, para intermediar e treinar.
  • Lista de sinais de alerta: Identificar e documentar comportamentos ou sinais precoces que podem indicar o início de um episódio maníaco ou depressivo ajuda na intervenção precoce e eficaz. Aqui, o diário familiar que comentei acima, funciona super bem.

O apoio de familiares e amigos é um dos pilares mais importantes para aqueles que convivem com o transtorno bipolar. Pois, um ambiente compreensivo, informado e proativo pode ampliar significativamente o sucesso do tratamento e a qualidade de vida do paciente. Se você faz parte da rede de apoio de alguém com transtorno bipolar, saiba que seu papel é inestimável e pode fazer toda a diferença no processo de recuperação e estabilização.

O transtorno bipolar não precisa ser estigmado

É crucial lembrar que o transtorno bipolar, como qualquer outra condição de saúde, não define uma pessoa. Infelizmente, o estigma associado aos transtornos mentais muitas vezes impede que indivíduos busquem o tratamento necessário, levando a um ciclo de isolamento e sofrimento. No entanto, juntos, podemos mudar essa narrativa.

Como familiares e amigos, podemos desmistificar os mitos envolvidos e promover a aceitação.

A mudança acontece em pequenos gestos diários. É uma conversa sobre saúde mental de maneira respeitosa, oferecer ajuda no momento necessário, e assim por diante. Porém, o que é verdadeiro é a necessidade de um paciente com bipolaridade procurar uma ajuda psiquiátrica para estabilizar seu humor e ter um acompanhamento próximo.

É um investimento necessário, mas que pode trazer muita qualidade de vida para o paciente e sua família.

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