Hoje vou sair um pouco dos temas da psiquiatria infantil e falar da saúde da mulher, porém sem fugir muito já que as adolescentes também podem sofrer desse transtorno.
Todas nós mulheres sabemos bem o que é a famosa TPM, conhecida também por SPM (Síndrome Pré-menstrual), mas e a TDPM, vocês já ouviram falar?
A Disforia Pré-Menstrual (TDPM ou Transtorno Disfórico Pré-Menstrual) é uma forma grave e incapacitante da Síndrome Pré-Menstrual (SPM), caracterizada por sintomas físicos, emocionais e comportamentais que ocorrem na fase lútea, que é a segunda metade do ciclo menstrual, que ocorre após a ovulação e antes da menstruação. Ao contrário da SPM, que afeta cerca de 75% das mulheres em idade fértil com sintomas leves a moderados, com certeza podemos chamar de grandes felizardas estas outras 25%. Já a TDPM afeta aproximadamente 3% a 8% dessa população e apresenta sintomas severos o suficiente para impactar negativamente a qualidade de vida, as relações interpessoais e o desempenho ocupacional.
Por isso, quero neste texto explorar detalhadamente a TDPM, tentando abordar quadro clínico, diagnóstico, manejo e tratamento, além de orientações práticas para pacientes da maneira mais leve e fácil para que todas entendam.
A fisiopatologia da TDPM
A fisiopatologia, ou seja, os estudos dos processos anormais que levam ao desenvolvimento de doenças, lesões ou transtornos, da TDPM ainda não é completamente compreendida. Porém, acredita-se que esteja relacionada a uma resposta exagerada das flutuações hormonais normais do ciclo menstrual, particularmente do estrogênio e da progesterona. Essa sensibilidade hormonal anormal pode influenciar neurotransmissores cerebrais, especialmente a serotonina, velha conhecida nossa, que desempenha um papel crucial na regulação do humor.
Estudos apontam que mulheres com TDPM podem ter uma menor atividade da serotonina, levando a sintomas depressivos e ansiosos durante a fase lútea. Além disso, alterações nos receptores GABA (ácido gama-aminobutírico), dopamina e noradrenalina também podem estar envolvidas no desenvolvimento do transtorno.
Quadro clínico
A TDPM é caracterizada por um conjunto de sintomas emocionais, físicos e comportamentais que surgem cerca de 5 a 10 dias antes da menstruação (fase lútea) e desaparecem após o início do fluxo menstrual. Assim, os sintomas podem variar em intensidade e duração. Vou dividir em classes os mais comuns, frequentemente vistos em meu consultório.
Os sintomas emocionais
- Irritabilidade intensa: A irritabilidade é um dos sintomas mais comuns e pode ser direcionada a familiares, amigos ou colegas de trabalho.
- Ansiedade severa: Sensação de tensão, nervosismo e inquietação marcantes.
- Depressão: Sentimentos de desesperança, tristeza profunda e até mesmo pensamentos suicidas em casos graves.
- Oscilações de humor: Mudanças abruptas no estado emocional, passando rapidamente de irritada para chorosa, por exemplo.
- Dificuldade de concentração: Diminuição na capacidade de focar em tarefas cotidianas.
Os sintomas físicos
- Sensibilidade mamária: Dor ou desconforto nos seios.
- Distensão abdominal: Inchaço abdominal, sensação de “barriga cheia”, aqueles dias que claramente nos sentimos como um baiacu.
- Cefaleia: Dor de cabeça, muitas vezes intensa.
- Fadiga: Sensação de cansaço extremo, mesmo após descanso adequado.
- Alterações no apetite: Desejo por alimentos específicos, geralmente ricos em açúcar ou carboidratos, ou, em contrapartida, perda de apetite (mais raramente).
Alguns sintomas comportamentais
- Isolamento social: Evitação de interações sociais devido à irritabilidade ou depressão.
- Dificuldade em manter atividades rotineiras: Falta de motivação para ir ao trabalho, realizar tarefas domésticas ou atividades recreativas.
- Redução da libido: Diminuição acentuada do desejo sexual.
Para confirmarmos o diagnóstico de TDPM esses sintomas devem ser monitorados ao longo de pelo menos dois ciclos menstruais consecutivos.
Diagnóstico da TDPM
O diagnóstico da TDPM é totalmente clínico e baseia-se nos critérios estabelecidos pelo DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª edição). Para que o diagnóstico seja confirmado, é necessário que:
- Cinco ou mais sintomas estejam presentes durante a maior parte da semana anterior ao início da menstruação, melhorando dentro de poucos dias após o início do fluxo menstrual e estando ausentes na fase folicular (após a menstruação).
- Pelo menos um dos sintomas seja emocional, como:
- Humor deprimido, sentimentos de desesperança ou autodepreciação.
- Ansiedade intensa ou tensão.
- Labilidade emocional acentuada.
- Irritabilidade ou raiva marcante.
Critérios Diferenciais
A TDPM pode ser confundida com outras condições psiquiátricas e ginecológicas, como:
- Transtorno depressivo maior: Os sintomas não se limitam à fase lútea.
- Transtorno de ansiedade generalizada: A ansiedade é contínua ao longo do ciclo menstrual.
- Síndrome Pré-Menstrual (SPM): Sintomas menos graves e menos incapacitantes.
Por isso uma avaliação psiquiátrica minuciosa deve ser feita para descartar estas outras condições.
O tratamento da TDPM
O tratamento da TDPM envolve uma abordagem multidisciplinar, combinando medicamentos, psicoterapia e mudanças no estilo de vida.
Tratamento medicamentoso
Antes de mais nada, quero ressaltar que aqui eu trago informações de possibilidades. Cada caso será determinado um tratamento de forma estratégicas após uma consulta. Pode ser que para você uma estratégia funcione e para sua colega, ou até irmã gêmea, seja outra. Sim, cada corpo é um corpo. Combinado?
Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRS)
Os ISRS (Fluoxetina, Sertralina, Paroxetina) são a primeira linha de tratamento para a TDPM, devido à sua eficácia na redução dos sintomas emocionais e comportamentais.
Esses medicamentos podem ser administrados continuamente (o mais eficiente) ou apenas na fase lútea, dependendo MUITO da resposta individual.
Anticoncepcionais hormonais
Os anticoncepcionais orais combinados podem ajudar a estabilizar as flutuações hormonais que desencadeiam os sintomas da TDPM. As formulações contendo drospirenona parecem ser particularmente eficazes.
Análogos do GnRH
Nos casos mais graves e resistentes ao tratamento convencional, os análogos do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) podem ser usados para induzir um estado de menopausa temporária, suprimindo a ovulação.
Suplementos alimentares
Cálcio: Alguns estudos sugerem que a suplementação de cálcio diário pode reduzir sintomas físicos e emocionais.
Magnésio: Pode ajudar a diminuir a irritabilidade e a fadiga.
Psicoterapia
A terapia cognitivo-comportamental (TCC) tem mostrado eficácia no manejo da TDPM, ajudando as pacientes a identificar e modificar padrões de pensamento e comportamento disfuncionais. A TCC pode ser particularmente útil para:
- Gerenciar a ansiedade e a depressão associadas.
- Melhorar a regulação emocional.
- Desenvolver estratégias de enfrentamento para os períodos mais críticos do ciclo menstrual.
Mudanças no Estilo de Vida
Medidas não farmacológicas também desempenham um papel importante no controle dos sintomas:
Alimentação balanceada
Evitar cafeína, álcool e alimentos ricos em açúcar e sal pode ajudar a reduzir a retenção de líquidos e a irritabilidade.
Aumentar o consumo de frutas, vegetais, grãos integrais e proteínas magras.
Exercício físico
Primeiramente, a atividade física regular, como caminhada, ioga ou pilates, pode melhorar o humor, reduzir a ansiedade e promover uma melhor qualidade de sono. Por isso, digo sempre às minhas pacientes que a atividade física faz parte do tratamento e deve ser incluída na rotina, e o ideal é que seja uma atividade que lhe dê prazer, gosta de dançar? Dance. Prefere bike? Pedale. Gosta do ambiente da academia? Bora puxar ferro. Seja o que for que prefira fazer, apenas faça.
Práticas de Relaxamento
Técnicas como meditação, mindfulness e respiração profunda podem ajudar a aliviar o estresse e a tensão associados à TDPM.
O que deve ser feito: Orientações práticas
Mas e aí, doutora, o que eu faço? Simples, apenas:
- Monitore os sintomas: Mantenha um diário dos sintomas ao longo de pelo menos dois ciclos menstruais para identificar padrões e confirmar o diagnóstico. Hoje temos aplicativos que nos ajudam muito com isso.
- Procure ajuda profissional: Consulte um ginecologista e psiquiatra ao perceber que os sintomas interferem significativamente na qualidade de vida. Estarei aqui, no Instituto Alceu Giraldi, é só chamar.
- Aderir ao tratamento: Siga as orientações médicas, tanto em relação à medicação quanto à psicoterapia e mudanças no estilo de vida.
- Estabeleça uma rede de apoio: Compartilhe a situação com familiares e amigos próximos pode ajudar a lidar com os desafios emocionais e sociais.
Espero ter explicado de forma prática sobre esse transtorno complexo que requer uma abordagem diagnóstica e terapêutica cuidadosa. Lembrando à você que, embora possa ser debilitante, o tratamento adequado, aliado a estratégias de enfrentamento eficazes, permite que a maioria das mulheres afetadas alcance uma melhora significativa em sua qualidade de vida. Portanto, não hesite em procurar ajuda, entre em contato, agende uma consulta, e eu farei o possível para ajudá-la, porque não devemos perder uma semana de nossas vidas todos meses apenas por termos um útero.
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